A Prefeitura de Divinópolis, por meio da Secretaria Municipal de Cultura (Semc), realizou no último domingo (31/8), no Complexo Usina Gravatá, o 1º Festival de Comida Preta. O encontro reuniu centenas de pessoas em torno de comidas típicas, apresentações culturais e rodas de conversa que exaltaram a força da ancestralidade e da cultura preta no município.
O festival contou ainda com o apoio do Ateliê Fátima Gonçalves, Casa Coletiva, Circuito 037, Trupe Boba, Solart Studio, Pavo Produtora, Coletivo Takará, Coletivo Mãe Preta. Logo na abertura, uma roda de conversa trouxe reflexões profundas sobre comida, pertencimento, religião e família. A historiadora e arte-educadora Fátima Gonçalves, a carismática e influente “Mãe Fatão”, falou sobre a importância da receptividade e da partilha para os povos negros. “Nós estamos muito mais para servir, cuidar e orientar, do que para ‘reinar’ com o almoço do dono ou dos educados da paisagem. A gente reúne a família toda para preparar esse alimento. A gente reza junto, tem muito cuidado ao manusear, pensa no que vai cozinhar e se preocupa em receber bem quem chega. Sentamos à mesa garantindo que todos sejam bem alimentados”, destacou Fatão, emocionando o público.
A mãe de santo Reisla, iniciada no Candomblé, reforçou a relação de respeito e espiritualidade com a comida. “Lá em casa, a comida é sagrada. Tudo o que passamos no Candomblé é aproveitado. Nós comemos com os olhos, precisamos preparar tudo com amor e carinho para alimentar bem os nossos”, afirmou.
A nutricionista Ana Paula, mulher preta, lembrou que o ato de se alimentar vai além do prato, trazendo consigo memórias e significados. “Nós perdemos a sacralidade de comer juntos, como antigamente. Precisamos parar o momento para preparar a comida com nossas famílias e filhos. O que estamos ensinando hoje às crianças será a memória que carregaremos no futuro”, disse.
Ela acrescentou ainda a importância de cultivar e preservar esses saberes. “Guardemos com carinho os saberes ancestrais. Além de salvar a coletividade, em qualquer lugar do mundo haverá sentido e proteção no alimento, seja ela de carne ou espiritual”, refletiu.
Para Agatha Nelise de Castro Jesus, da organização do evento, o festival simbolizou um marco para o fortalecimento das práticas coletivas já vivenciadas em grupos locais. “É muito emocionante, porque significa fortalecer o que já fazemos todos os dias juntos. Agora podemos compartilhar com mais pessoas como celebramos a alimentação e a união. Acredito que este festival vai nos tornar uma grande família, expandindo para toda Divinópolis o que já vivíamos no entorno da Mãe Fatão”, disse.
Cultura, infância e arte lado a lado
O evento contou ainda com o espaço EducaKids, onde crianças foram estimuladas a despertar o interesse pela culinária e a manter viva a tradição afro-mineira. Após o almoço especial gratuito — que serviu pratos como feijoada e galinhada — o público acompanhou a apresentação cênica do grupo Trupe Boba, com a peça Matri.
O encerramento ficou por conta do show “Samba de Preto Velho”, do artista Sérgio Pererê, que levantou o público com música e emoção.
O Festival de Comida Preta não se limitou a um cardápio típico: foi um espaço de memória, resistência, oralidade e celebração da cultura. Mais do que enaltecer sabores, o evento reafirmou a importância de manter vivas as tradições e fortalecer a autoestima da população preta em Divinópolis.
Ao promover essa iniciativa inédita, a Prefeitura de Divinópolis reforça seu compromisso em valorizar a diversidade cultural e fomentar ações que unem gastronomia, identidade e pertencimento.
“Com o Festival de Comida Preta, damos um passo importante para reconhecer e valorizar as raízes que formam nossa identidade cultural. A comida não é apenas alimento: é memória, é resistência, é um elo que conecta gerações e histórias. Ao realizar essa iniciativa inédita, a Prefeitura reafirma seu compromisso com a diversidade e com a promoção da igualdade racial, criando espaços onde tradições são preservadas e celebradas com orgulho. Queremos que Divinópolis seja um território de pertencimento, onde cada cidadão se sinta representado e respeitado em sua cultura”, destacou o secretário Municipal de Cultura, Mardey Russo.